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Uma perspectiva historiográfica sobre os processos de formação de palavras em latim: podemos falar em prefixação?

A historiographical perspective on the processes of word formation in Latin: can we talk about prefixation?

Fernanda Cunha Sousa
Universidade Federal de Juiz de Fora, Brasil
Fernando Adão de Sá Freitas
Universidade Federal de Juiz de Fora, Brasil

Uma perspectiva historiográfica sobre os processos de formação de palavras em latim: podemos falar em prefixação?

Classica - Revista Brasileira de Estudos Clássicos, vol. 35, núm. 1, pp. 1-20, 2022

Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos

Recepción: 25 Enero 2022

Aprobación: 21 Marzo 2022

Resumo: Este trabalho discute alguns aspectos dos processos de formação de palavras em latim a partir da perspectiva da Historiografia da Linguística (HL) sobre o tema da prefixação. Nosso objetivo é mostrar diferentes abordagens metalinguísticas sobre a morfologia e sobre o fenômeno da prefixação. Primeiramente, focalizamos alguns testemunhos dos autores da Antiguidade, em especial os dos gramáticos latinos (Grammatici Latini GL). Depois, enfatizamos reflexões de autores de gramáticas da língua latina, como Ernesto Faria (1958) e Maurer Jr. (1959), e traçamos um paralelo histórico sobre o aspecto da análise morfológica nas postulações presentes em Marouzeau (1921) e Câmara Jr. (1989 [1941], 1972 [1970]). Ancoramos nossas observações teóricas e metodológicas nos textos de Law (1990, 2000, 2003) e Swiggers (1992, 2000). Este estudo demonstra que os gramáticos não têm tratado o fenômeno da prefixação de maneira homogênea ao longo tempo, o que nos leva a concluir que o aspecto metalinguístico presente em cada um dos autores deve ser estudado e interpretado à luz de seu próprio contexto de produção.

Palavras-chave: morfologia, derivação, composição, afixo, palavra.

Abstract: This work discusses some aspects of the processes of word formation in Latin, from a perspective based in Historiography of Linguistics (HL) on the subject of prefixation. Our objective is to show different metalinguistic approaches about morphology and about the phenomenon of prefixation. In the historiographical plan, we focus on some testimonies by ancient authors, especially those by Latin grammarians (Grammatici Latini – GL). Later, we emphasize reflections by authors of Latin grammars, such as Ernesto Faria (1958) and Maurer Jr. (1959), and we trace a historical parallel on the aspect of morphological analysis in the postulations present in Marouzeau (1921) and Câmara Jr. (1989 [1941], 1972 [1970]). We anchor our theoretical and methodological observations in the texts of Law (1990, 2000, 2003) and Swiggers (1992, 2000). This study demonstrates that grammarians did not treat the phenomenon of prefixation homogeneously over time, what lead us to conclude that the metalinguistic aspect present in each of the authors should be studied and interpreted in the light of their own production context.

Keywords: morphology, derivation, composition, affix, word.

1. Introdução

Nossa pesquisa se orienta em duas direções bem delimitadas. A primeira, que é foco específico deste trabalho, debruça-se sobre a pluralidade das reflexões linguísticas e gramaticais que foram (ainda são, em certa medida) arroladas a respeito do processo de prefixação na língua latina, a partir de anotações para preparação de aulas do curso de morfologia da graduação em latim da Universidade Federal de Juiz de Fora, ministrado por Fernanda Cunha Sousa, além de discussões possibilitadas por orientação de estágio de docência do então doutorando Fernando Adão de Sá Freitas. Já a segunda parte do escopo temático desta pesquisa deriva parcialmente da tese de doutoramento de Fernando Adão de Sá Freitas.1

Nosso estudo, portanto, instaura-se com uma perspectiva historiográfica e linguística por elencar observações gramaticais e linguísticas traçadas por alguns estudiosos ao longo tempo, desde a Antiguidade greco-romana até a Linguística contemporânea, em relação ao tema do fenômeno morfológico nomeado modernamente como prefixação.2 Primeiramente, abordaremos os testemunhos dos autores da Antiguidade, em especial aos gramáticos latinos (Grammatici Latini – GL). Em seguida, discutiremos algumas reflexões de autores de gramáticas da língua latina, em especial as postulações presentes em Ernesto Faria (1958), bem como a posição de linguistas e gramáticos modernos, e, em especial, as de Câmara Jr. (1989 [1941], 1972) e Maurer Jr. (1959) sobre o tema. Assim, pretendemos demonstrar como a reflexão metalinguística sobre a morfologia latina sempre esteve em constante movimento e alteração.

Para contextualização da questão problema, recorremos aos pressupostos teóricos e analíticos da Historiografia da Linguística (HL), ancorando-nos, portanto, nas considerações de Vivien Law (1993, 1996, 2000, 2003) e Pierre Swiggers (1990, 1992, 2000) em relação ao surgimento da discussão sobre a morfologia no âmbito das reflexões gramaticais gregas e latinas e à consolidação da terminologia e da metalinguagem3 referente a esse campo de investigação.

Nosso corpus de investigação divide-se em dois, respeitando não só o tema em questão, mas também o caráter cronológico.4 A primeira parte atém-se a algumas considerações empreendidas pelos próprios GL no que se refere ao processo de formação das palavras, ao abordarem as partes da oração (partes orationis). Para além do rol de autores que ficaram designados dentro da expressão GL – compreendidos entre os séculos II a VI d. C. – também fazemos menções às considerações de Varrão (séc. I a. C.), gramático e polímata da época da República de Roma.5 A segunda parte atém-se fundamentalmente aos textos de Faria (1958) e Maurer Jr. (1959), respectivamente Gramática superior da língua latina e Gramática do latim vulgar.

Todas as traduções ao longo deste texto são de nossa autoria, salvo indicação contrária em nota. Agradecemos aos pareceristas pelas considerações.

2. Uma nota sobre a história da terminologia

Do ponto de vista moderno, August Schleicher, em seu artigo de 1859, intitulado Zur Morphologie der Sprache (A morfologia da língua), foi o primeiro autor a utilizar o termo morfologia para a descrição das línguas. A gênese dessa terminologia, por sua vez, está vinculada ao campo de investigação da biologia, sendo, dessa forma, uma importação vocabular de um domínio científico para outro, a saber, da biologia para a linguística (Salmon, 2000, p. 15).6

Torna-se necessário ressaltar, neste ponto, embora não adentremos nos pormenores deste fato no presente trabalho, que, segundo a investigação realizada por Robins (2000, p. 52), não há vestígio do vocábulo morfologia nos textos gregos que nos chegaram da Antiguidade, assim como na terminologia gramatical e linguística que se erigiu ao longo do tempo para descrever os processos morfológicos.

Para além da Antiguidade, também não há registro em todo o período medieval de uma terminologia que se assemelhe ao que se convencionou chamar de “raiz”, “tema”, “afixo”, “marcador”/”traço”, “morfema” e outros (Law, 2000, p. 79-80).7 Nesse sentido, antes de iniciarmos nossa reflexão a respeito do fenômeno linguístico/gramatical denominado de prefixação, pontuamos que, embora o campo da investigação morfológica tenha se firmado como um dos mais estudados e discutidos na tradição gramatical e linguística desde a Antiguidade, a terminologia empregada para descrição de tais fenômenos, pelo menos no que tange aos textos da Antiguidade e do período medieval, representa uma espécie de lacuna na história do pensamento linguístico.

Essa “ausência” de uma terminologia específica nos gramáticos da Antiguidade e do período medieval – se é que podemos pensar assim – sobre os aspectos morfológicos pode estar relacionada, em certa medida, à forma como era considerada a unidade mínima da língua. De acordo com Law (1990, p. 440):

a morfologia era um aspecto formal da língua que foi perseguido com grande convicção. Antes do Renascimento, a ideia de que uma forma poderia ser derivada de outra foi pouco explorada. Cada palavra era considerada como uma unidade semântica, não havia motivo para isolar unidades menores...8

Encontra-se, portanto, tanto nos gramáticos gregos, como nos latinos, uma preocupação ou uma profusão de análises e definições sobre as “partes da oração” (partes orationis), as quais se tornaram nucleares nas gramáticas latinas, como aponta a seguinte ponderação do gramático romano Sérvio (séc. V d. C.):

Muitos começaram a escrever suas artes pelo tratado das letras, muitos pela voz, muitos pela definição de gramática. Mas parece que todos erraram, porque não trataram de uma matéria exclusiva de seu ofício, mas comum tanto aos oradores quanto aos filósofos. Pois também o orador pode tratar das letras, e ninguém trata da voz mais do que os filósofos: a definição, por sua vez, é cara aos aristotélicos. Daí Donato ter procedido de forma mais inteligente e apropriada, pois começou pelas oito partes da oração, que pertence especificamente ao gramático.9 (Sérvio, GL IV.405.4-11).

A observação de Sérvio sobre a forma como Donato (séc. IV-V d. C.) estruturou sua reflexão acerca dos tópicos gramaticais refere-se diretamente ao texto conhecido pela tradição moderna10 como Ars Minor, texto no qual Donato empreende uma descrição exclusiva das partes orationis. Já na Ars Maior, texto mais longo e descritivo em relação aos fenômenos gramaticais da língua latina, Donato coloca as partes orationis depois de tratar dos aspectos da Vox (voz).11 Ainda que o testemunho de Sérvio nos leve a uma discussão sobre a estrutura geral das artes gramamaticae, o que nos interessa, nesse ponto, é destacar a importância que o gramático dá ao tópico das partes orationis.

Nesse sentido, o uerbum, isto é, a “palavra” era tida como o mais proeminente objeto de análise. Consequentemente, os gramáticos, desde as ponderações de Varrão, em seu De lingua latina, com 25 volumes,12 destinaram considerações analíticas, cunharam uma terminologia e uma metalinguagem que perpassam, em maior ou menor grau, a tradição posterior.

Em Varrão, encontramos um tratamento que diferencia processos de formação de palavras: declinatio naturalis e a declinatio uoluntaria (LL VIII, 21-2).13 Nesse sentido, o autor faz distinção entre as partes formadoras de novas palavras, ditas de derivação, e partes indicadoras de flexão, que adaptam cada palavra às condições específicas de dado contexto. Tendo em vista o início desse questionamento, veremos, a seguir, como os gramáticos latinos posteriores lidaram com os processos de formação.

3. Os processos de formação de palavras: os Grammatici Latini em destaque

Adotamos, como exemplo, as considerações presentes em Donato, na Ars Minor e Ars Maior14 e em Santo Agostinho/Agostinho de Hipona (séc. IV-V d. C.), na Ars pro fratrum mediocritate breuiata (Ars breuiata, ed. Bonnet, 2013).15

Segundo Donato (séc. IV d. C.), na Ars Maior:

Praepositio est pars orationis, quae praeposita aliis partibus orationis significationem earum aut conplet aut mutat aut minuit. (Donato, H 648)

Preposição é a parte da oração que, preposta às demais partes da oração, complementa, altera ou diminui a significação delas.16

O primeiro aspecto da definição de Donato que destacamos consiste no caráter posicional que a preposição pode assumir, de anteceder (praepono/praeposita – prepostas) as outras partes da oração; um fenômeno que tanto pode complementar, alterar ou restringir a significação (significatio) das demais partes. Nesse sentido, o critério posicional das preposições também afeta o sentido, seja do vocábulo, seja da combinação/junção com outras palavras (em latim as preposições regem os casos accusatiuus e ablatiuus).

Os critérios de Donato, estudioso analítico e descritivo, poderiam ser, portanto, considerados morfossintáticos-semânticos, como demonstram as seguintes asserções:

Nam aut nomini praeponitur, ut inualidus; aut pronomini praeponitur, ut prae me, uel subponitur, ut mecum tecum nobiscum uobiscum; aut uerbum praecedit, ut perfero, aut aduerbium, ut expresse, aut participium, ut praecedens, aut coniunctionem, ut absque, aut se ipsam, ut circumcirca. (Donato, H 648)

De fato, ou prepõe-se ao nome, como inualidus; ou prepõe-se ao pronome, prae me, ou lhe sucede, como mecum, tecum, nobiscum, uobiscum; ou precede o verbo, como perfero, ou o advérbio, como expresse, ou o particípio, como praecedens, ou a conjunção, como absque, ou a si mesma, como circumcirca.17

Nessa passagem, Donato elenca que a preposição pode ser preposta a sete das oito partes da oração, à exceção apenas das interjeições. O dado curioso consiste no fato de que o autor não menciona que tal processo possa ser identificado como um acidente (accidens) das preposições, posto que, para o gramático: Praepositioni accidit casus tantum (a preposição tem como acidente apenas o caso),18 cf. Donato, H 649.19

A argumentação de Donato parecer vincular-se ao seu posicionamento como gramático da língua latina, uma vez que tece o seguinte comentário:

Sunt qui putant accidere praepositioni et figuram et ordinem: figuram, quia sunt praepositiones simplices, ut abs, conpositae, ut absque; ordinem, quia sunt praepositiuae praepositiones, ut sine, sunt subiunctiuae, ut tenus. Sed haec nos et similia in his numerabimus, quae inaequalia nominantur. (Donato, H 651-2)

Há quem julgue que a preposição tem ainda acidentes como figura e ordem, porque há preposições simples, como abs, e compostas, como absque; ordem porque há preposições prepositivas, como sine, e pospostivas, como tenus. Mas nós contaremos estas e outras semelhantes entre aquelas que se denominam irregulares.20

No excerto, os gramáticos que consideram a figura e a ordo como um dos acidentes das preposições, ao que parece, estão do lado oposto ao de Donato. Quando menciona sunt qui putant “há quem pense/julgue” que as preposições possam ser simples (simplex) ou compostas (composita), já que seria possível identificar o fenômeno nas preposições abs, absque, sine e tenus, explicita sua posição contrária, pontuando textualmente que “nós” (nos) contaremos (numerabimus) como palavras ou fenômenos “irregulares” (inaequalia).

Donato também é bem descritivo quando considera quais preposições funcionam como elementos independentes ou não:

Quae praepositiones sunt, quae dictionibus seruiunt et separari non possunt? Vt di, dis, re, se, am, con. Quo modo? Dicimus enim diduco, distraho, recipio, secubo, amplector, congredior. Quae sunt, quae iungi non possunt? Vt apud, penes. Quae iunguntur et separantur? Reliquae omnes. (Donato, H 601).

Quais são as preposições que dependem das palavras e não podem se separar? Estas: di, dis, re, se, am, con. Como? Pois dizemos diduco, distraho, recipio, secubo, amplector, congredior. Quais são as que não podem se juntar? Estas: apud, penes. Quais se juntam e se separam? Todas as outras.21

Na postulação das Ars Minor, como visto, Donato destaca que as preposições di, dis, re, se, am, con possuem um comportamento dependente, bem como aponta que apud e penes são preposições que não podem se combinar/juntar. Nesse sentido, a polaridade do fenômeno em questão pode ser entendida por meio do emprego do verbo seruiunt (dependem) e da expressão separari non possunt (não podem se separar) com a expressão iungi non possunt (não podem se juntar).

Quando Donato menciona “quais se juntam e se separam?” (quae iunguntur et separantur), estes dois verbos latinos, iungere e separare, formam os polos de oposição. A resposta de Donato também tem um tom intrigante, posto que a expressão “todas as outras” remete, ao que parece, ao grupo de preposições arroladas anteriormente. Diante disso, podemos perceber que suas considerações alcançam minúcias do processo de formação de palavras em latim, mas também é visível que adota certos limites descritivos e analíticos.22

Em Agostinho, autor contemporâneo de Donato, observamos a seguinte conside-ração sobre as palavras simples e compostas, ao refletir acerca da figura (forma) dos nomes na Ars breuiata:

Figura nominum est per quam consideratur utrum simplex an compositum nomen sit. Est autem compositum nomen cum fit unum ex duabus uel pluribus partibus orationis, cum dicimus ineptus uel ininexpugnabilis. Nam illud de duabus, hoc partibus orationis confectum est.23

A forma dos nomes é a categoria pela qual um nome é considerado simples ou composto. Ora, o nome é composto quando se forma a partir de duas ou mais partes da oração, como quando dizemos: ineptus ou inexpugnabilis. De fato, aquele foi composto de duas, este de três partes da oração. (Agostinho, Ars br., I, 8)

As considerações de Agostinho sobre as formas das palavras em latim, em especial no que se refere aos nomes, parece seguir de perto a tradição gramatical da Antiguidade.24 A composição dos nomes, portanto, pode se dar por meio de adjunções ou combinações de várias partes da oração com outras, ineptus = in + aptus e inexpugnabilis = in + ex + pugnabilis.25 A proeminência das preposições somadas aos nomes se destaca. A distinção entre duas ou três partes da oração que se combinam para formar outro vocábulo fica clara na explicação: “De fato, aquele foi composto de duas, este de três partes da oração” (Nam illud de duabus, hoc ex tribus partibus orationis confectum est). É curioso notar, em certa medida, que Agostinho emprega, por meio das preposições de e ex, uma espécie de ablativo de origem, assim como faz uma retomada dos elementos por meio dos pronomes illud e hoc.

Chegamos, assim, ao núcleo da reflexão sobre os gramáticos latinos – isto é, não há, na terminologia latina, algo que se assemelhe aos conceitos de prefixos ou sufixos modernos. Mas é nítida sua preocupação com os processos de formação das palavras e as maneiras de descrevê-los metalinguisticamente, o que nos leva a afirmar que é temerário ir aos autores da Antiguidade buscar soluções ou fazer “checagens”, principalmente quando a busca é feita apenas para encontrar um termo ou conceito, desconsiderando o trabalho descritivo e analítico dos gramáticos.

Veremos, na sequência, que o tema da formação das palavras, assim como seu arcabouço teórico e descritivo, também é muito caro aos gramáticos e linguistas modernos, assim como foi, e continua sendo, um desafio para os autores que se destinaram a escrever uma gramática da língua latina no mundo moderno.

4. Os processos de formação de palavras: os modernos e suas considerações

Para Marouzeau (1921, p. 28), em sua obra La Linguistique ou Science du Langage: “a morfologia é o estudo da formação das palavras”.26 A definição aparentemente simples apresentada esconde, sob o conceito de “formação” (formation), a complexidade que se erige ao estudar as partes/os componentes das palavras (mots). O estudioso francês destaca que as palavras possuem sufixos (suffixes) e prefixos (préfixes), sendo aqueles a primeira característica a ser destacada na sequência da definição. Apenas na página seguinte o estudioso francês pondera sobre os prefixos ao postular que:

Le mot s’allonge ainsi par la fin. Mais il arrive aussi qu’il s’allonge par le commencement: sur avantage on fait davantage comme d’abord sur abord; de (réduit ici à d’ ou à d-) est devenu préfixe. Comme le suffixe, le préfixe sert à modifier le sens d’un mot: - marque une altération (déformer), re- le retour a un état antérieur (reformer)...27

É possível notar que o ponto principal em relação ao tópico tratado por Marouzeau nessa passagem concentra-se, em especial, no aspecto semântico que a inserção de um prefixo ocasiona, isto é, “serve para modificar o sentido de uma palavra”. Do ponto de vista da descrição morfológica, podemos perceber, por outro lado, que o autor descreve o processo em termos de “alongamento”, ou seja, enquanto o sufixo alonga a palavra no “final” (fin), o prefixo, por sua vez, alonga-a em seu “início” (commencement).

Se, por um lado, a reflexão de Marouzeau (1921) parece nos causar um certo estranhamento, por outro lado, a forma como o linguista norte-americano Bloomfield (1933) tece, pouco tempo depois, suas considerações sobre o domínio da morfologia impacta, de maneira profunda, como os linguistas passaram a examinar e a adotar suas postulações,28 ainda que com algumas ressalvas,29 e circulou significativamente entre linguistas e gramáticos brasileiros. Em Mattoso Câmara Jr. (1989 [1941]; 1972 [1970]), encontramos os conceitos bloomfieldianos de “formas livres” (free forms) e “formas presas” (bound forms) (Bloomfield, 1933, p. 160), na sua reflexão sobre a estrutura da língua portuguesa.

Segundo esses conceitos, formas livres podem funcionar sozinhas como comunicação suficiente; as presas (como prefixos e sufixos) só funcionam ligadas a outras. Mattoso Câmara Jr. introduz o conceito de formas dependentes para abranger as partículas proclíticas e enclíticas do português (como artigos, preposições, pronomes átonos). Tais formas funcionam ligadas às formas livres, mas distinguem-se delas porque não podem funcionar isoladamente como comunicação suficiente, e das presas pela possibilidade de intercalação de novas formas e de variação posicional na frase.

Diante desses aspectos, a diferença metalinguística entre o testemunho de Marouzeau (1921) e o de Bloomfield (1933), introjetado na tradição linguística e, em certa medida, gramatical brasileira, por Mattoso Câmara Jr. (1989 [1941]; 1972 [1970]), consiste no fato de que: em Bloomflied, além da metalinguagem, a terminologia também é divergente, isto é, “forma livres” e “formas presas” são colocadas respectivamente sob o desígnio de “vocábulos” e “afixos” (Câmara, Jr. 1989 [1941], p. 87-8). É possível depreender que tanto a terminologia como a metalinguagem empregada para a análise e descrição das línguas foi realizada de maneira distinta por tradições de pesquisa específicas.

Cabe-nos, deste ponto em diante, tecer algumas considerações a partir de Ernesto Faria (1958) e Maurer (1959) no que se refere tanto ao latim clássico como ao latim vulgar.

4.1. As gramáticas latinas modernas: os estudos de Ernesto Faria e Maurer Jr.

Faria (1958), antes de arrolar características e exemplos da língua latina no que se refere ao estudo da morfologia,30 empreende uma definição sobre o campo a ser estudado pelo aluno de latim da seguinte forma: “a morfologia compreende o estudo das palavras e de todos os seus processos de formação, detendo-se especialmente no exame dos sistemas de flexão, isto é, de declinação e da conjugação” (Faria, 1958, p. 49). Em sua proposta, é possível observar que o estudioso separa os sufixos desinenciais dos demais, já que as desinências são de natureza flexional, – obrigatória, portanto –, enquanto os demais sufixos são de natureza derivacional – optativa, conforme a necessidade de expressividade do usuário da língua. Interessam-nos especialmente neste ponto do estudo os últimos.

Assim, podemos ter, em latim, os diferentes sufixos derivacionais:

Sufixos derivacionais, elaborada a partir de Faria (1958)
Tabela 1
Sufixos derivacionais, elaborada a partir de Faria (1958)

O autor afirma que a língua latina forma novas palavras, basicamente, a partir de dois tipos de processos: derivação por sufixação e composição; e atesta ainda o caráter arbitrário da significação agregada à palavra pelo sufixo. Por isso, os usuários da língua podem mudar de sentido e optar por fixá-lo segundo a circunstância. O sufixo derivacional pode ainda ter mais de um valor possível, conforme o contexto, ou seja, o significado da palavra se estabelece no uso, conforme a situação e necessidade de expressão daquele que a emprega (Faria, 1958), como demonstrado a seguir. Ex.: -ensis – indica relação de posse ou natureza – castrensis (relativo a acampamento), daí também lugar de nascimento – Carthaginiensis.

Faria (1958) não fala, nesse sentido, em prefixação no latim, mas em composição, subdividida de acordo com a natureza de seu primeiro elemento. Para o autor, a composição consiste no “processo pelo qual duas ou mais palavras se reúnem para formar um novo vocábulo, cuja significação é independente daquela de cada um dos elementos que a constituem isoladamente” (Faria, 1958). Assim, o primeiro elemento pode ser uma partícula, um tema (composto por radical + vogal temática) nominal ou verbal. Ainda segundo o autor, o mais frequente era a partícula como primeiro elemento, a qual podia ser um prevérbio (anteriormente separado do verbo) ou uma partícula prepositiva. Ex.: tema nominal – alti-tonans (que troveja alto); tema verbal – laudi-cenus (que faz elogio do jantar). Para Faria, são exemplos de composição no latim com o primeiro termo como partícula: abstineo (manter afastado de si) – formado com a partícula ab-; adeo (ir ter com/ir em direção) – formado com a partícula ad-, que expressa noção de aproximação; incognitus (desconhecido) – formado com a partícula negativa in- (Faria, 1958, p. 280).

Entendemos, portanto, que o que Ernesto Faria (1958) chama de composição com uma partícula como o primeiro termo enquadra-se no que denominamos como derivação por prefixação para o português,31 já que essas partículas não são consideradas atualmente como palavras (formas livres, dotadas de significado lexical, semantemas), mas somente vocábulos (formas dependentes, semelhantes a preposições e artigos do português, segundo Câmara Jr., 1975).

Furlan (2006a, p. 150), ao contrário de Faria (1958), faz menção a derivação por prefixação para o latim, mas a formas dependentes, somente a presas e livres.32 Furlan (2006a) fala ainda em prefixos que são formas livres (a, ab, abs, ad, ante) e prefixos que são formas presas seguidas de hífen (ambi-, dis-, ne-, re-, semi-). Neste ponto, entendemos que haja uma incoerência, pois o autor coloca ad na composição (com o exemplo ac-centus > ad cantus) e também na derivação por prefixação (com o exemplo ad-iungere).

Podemos destacar, em primeiro lugar, que a análise morfológica se atém ao vocábulo, ou seja, a palavra como objeto de descrição e análise. Para Faria, “os elementos ou formadores” de palavra são “raiz, sufixo e desinência” (1958, p. 52), assim como o processo de “redobro”. Para além desses quatro fenômenos, não se encontra registro referente ao processo de prefixação,33 como mencionamos anteriormente.

Há, por outro lado, na quarta e última parte da obra de Maurer Jr. (1959) sobre o latim vulgar, uma reflexão sobre a lexicologia, na qual é possível depreender não só um conceito de prefixação, mas também vários exemplos e explicações sobre o fenômeno.34 Entretanto, a sua tese sobre o processo de prefixação na língua latina não parece ser tão direta quanto uma leitura isolada do conceito e da definição possa parecer, posto que para o estudioso:

§ 130. Quando estudamos a prefixação do latim vulgar, partindo das línguas românicas – sobretudo se levamos em conta a concordância do romeno com as línguas do Ocidente – chegamos a resultados bem diversos dos que se obtêm quando do exame de textos eclesiásticos, do baixo latim e das línguas românicas ocidentais. E a razão é bem simples: enquanto o método comparativo nos põe em contacto com uma tradição genuinamente popular, a rica literatura patrística, apesar de uma certa simplicidade no léxico e na sintaxe, inspira-se no tesouro do latim literário, tornado muitas vezes mais livre nas criações lexicais pelo exemplo do grego, a grande fonte da erudição teológica nos primeiros séculos da história do cristianismo. O uso indiscriminável desse material leva inevitavelmente a uma imagem falsa da prefixação vulgar. Mesmo a concordância do latim eclesiástico com as línguas ocidentais da România pode ser ilusória, pois que muitas vezes as formas do romance procedem daquele. Os prefixos vivazes são alguns prevérbios, em número muito limitado, particularmente ad-, dis-, ex-, in-, talvez, re-. Outros, como con- e sub-, deviam ser raros, subsistindo principalmente em formações antigas (Maurer Jr., 1959, p. 211-2).

Dentre as considerações de Maurer Jr., sublinhamos o teor metodológico de sua reflexão, uma vez que aponta para os procedimentos da análise gramatical, destacando que estudar o fenômeno da prefixação a partir das línguas românicas para reconstituição do latim vulgar diverge, em grande parte, do estudo empreendido quando o objeto de partida advém de textos literários latinos. Nesse sentido, embora possamos também colocar alguma reticência quanto ao aspecto valorativo entre baixa literatura e uma literatura considerada “alta” ou de “prestígio”, o fato é que a nota metodológica fixada por Maurer Jr. evidencia a pluralidade do objeto analisado, o qual, em primeira instância, pode ser considerado latim de forma genérica; por sua vez, devido aos processos históricos e culturais ocasionados pelo fator do tempo, a matéria linguística e/ou gramatical contida nas mais diversas formas de registro devem ser sempre consideradas, uma vez que o resultado da análise pode variar ou mesmo levar a equívocos algumas descrições, como seria, por exemplo, o caso da prefixação.

Outro dado presente ao final da consideração de Maurer Jr. reside no fato de que entra em cena o conceito de prevérbio. O autor destaca que tal processo seria mais produtivo linguisticamente. Diante disso, em termos metalinguísticos, temos, nesse ponto, que alguns prefixos seriam prevérbios?35

Uma separação entre as duas instâncias aparece quando postula sobre os prefixos nominais nos seguintes moldes: “[esses] são muito menos usados que os prevérbios. Grand-gent cita ad-, ex-, con-, ex- e re- etc., notando que se empregavam, às vezes, para formar adjetivos” (Maurer Jr., 1959, p. 241-5). A distinção entre os processos de prefixação e de prevérbios, em certo sentido, não estava metalinguisticamente delimitada. O dado curioso é que linguística e/ou gramaticalmente havia uma fronteira que os separava, isto é, os verbos. Se retornarmos à nota 33, veremos que Coutinho (1971) havia estabelecido uma fronteira mais sólida para a aplicação dos conceitos de prefixos e prevérbios, bem como já havia estabelecido em qual tradição gramatical – brasileira/portuguesa – era possível encontrar um ou outro.

Considerações finais

A história das reflexões e dos esforços envidados em prol do fenômeno da linguagem é uma parcela essencial de nossa história como seres humanos, e seu estudo não só nos ensina muito sobre a história da linguística (e sua proto-história), como também sobre o papel central que exerceu e ainda exerce a linguagem na história das culturas, das sociedades, das atividades intelectuais da humanidade. (Swiggers, 2013, p. 49)

As palavras de Swiggers, em epígrafe, ajudam-nos a encerrar a reflexão empreendida neste trabalho sobre os processos de formação de palavras em latim, uma vez que o percurso historiográfico que traçamos desde o início aponta para o fato de que cada época instituiu conceitos, empreendeu análises, realizou descrições distintas sobre o fenômeno chamado modernamente de prefixação.

Podemos concluir, portanto, que o fenômeno da prefixação na língua latina não deve ser considerado de forma homogênea. Vimos que os gramáticos latinos, em especial Donato, trataram o fenômeno da colocação de preposições antes de determinados vocábulos como nomes – entendidos nas gramáticas latinas tardias como substantivos e adjetivos –, e verbos – aspecto gramatical que pode, não sem ressalvas, ser considerado um modo de prefixação.

A dificuldade de se afirmar com mais ênfase tal consideração nos gramáticos latinos tardios deve-se ao fato de que a unidade mínima de significação era o uerbum. Dessa forma, como exemplificado anteriormente, uma preposição, como in, adicionada a um adjetivo, como felix, formula uma nova palavra: infelix. Assim, infelix é um todo semântico, cujo desmembramento nos fornece novamente duas partes orationis, ou seja, a preposição e o adjetivo e não um prefixo mais um adjetivo.

A complexidade desse processo também se faz presente nas reflexões dos autores modernos que se debruçaram sobre a língua latina e compilaram suas considerações metalinguísticas. Em Faria (1958), como destacamos, observamos uma abordagem por meio da reflexão da composição de palavras, o que se traduz pela maneira como o estudioso menciona as partículas somadas aos radicais latinos para formação de novas palavras. A proposta de Faria (1958) não se confunde, entretanto, com a postulação dos gramáticos latinos, nem poderia, uma vez que, para o gramático moderno a partícula não pode ser considerada uma parte dotada de significação plena, pois é considerada uma forma dependente.

Em Maurer Jr., por outro lado, foi possível perceber uma abordagem explícita do fenômeno da prefixação, bem como a menção ao fenômeno dos prevérbios. Maurer Jr. apresenta um tratamento direto para os fenômenos da prefixação e dos prevérbios, diferindo-se, assim, em aspectos terminológicos, tanto dos gramáticos latinos como de Ernesto Faria.

Em suma, a abordagem historiográfica do fenômeno da prefixação em latim requer dos que ensejam realizar considerações sobre a terminologia e a metalinguagem gramatical antiga, e mesmo moderna, cautela quanto às afirmações sobre os fenômenos da linguagem. Assim, responder categoricamente à pergunta que dá título ao nosso trabalho pode(ria) nos levar não só a sérias distorções, como também a reduzir a um só termo a história do pensamento gramatical e linguístico.

A partir deste estudo de cunho historiográfico, propomo-nos, então, a discutir, em próxima etapa deste trabalho, com base em princípios da linguística funcionalista, que não se deva considerar a prefixação como fenômeno uno e homogêneo e, por isso, globalmente encarado como um processo derivacional, ou composicional, ou como fronteira entre a derivação e a composição, mas como processo heterogêneo, de acordo com o estatuto derivacional ou composicional do elemento prefixal em tela.

Investigaremos, a partir disso, se é possível propor um continuum a fim de demonstrar o que, nesta etapa do estudo, parece ser uma gradualidade, necessária para uma análise que contemple os processos de formação de palavras e os diferentes comportamentos dessa categoria, de acordo com os prefixos presentes, conforme atestados ao longo dos trabalhos discutidos por nós.

Abreviações

B = Bonnet. (ed. Dositeu, 2005; Agostinho, 2013)

H = Holtz (ed. Donato, 1981)

LL = De lingua Latina

GL = Grammatici Latini (H. Keil)

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Notas

1 Agradecemos à CAPES pelo auxílio (código 001).
2 Ernout (1953), Ernout; Meillet (1951), Marouzeau (1921), Faria (1958, 1967), Maurer Jr. (1959), Furlan (2006). Estudiosos de línguas modernas, como Bloomfield (1933), Mattoso Câmara Jr. (1989 [1951], 1970, 1972).
3 Adotamos as definições de terminologia e metalinguagem de Swiggers (2010, p. 211). Segundo o pesquisador, terminologia corresponde a: “l’ensemble des termes techniques faisant partie d’un vocabulaire ‘théorique’ (circonscrit par rapport à un auteur, une école, une (sous-)discipline, etc.)”, enquanto metalinguagem diz respeito à “la terminologie et le vocabulaire, étudiés en rapport avec leur champ d’applicabilité et leur fonctionnement syntaxique, qui sont mis en oeuvre, dans l’étude d’un champ d’objets spécifiques, par un auteur, par une école, par une (sous-)discipline, etc.”
4 O problema em se abordar os textos da Antiguidade e grega e latina pelo aspecto cronológico vem sendo discutido por autores como Baratin & Desbordes (1981) e também por Law (1993, p. 2), ao considerar que: “To impose a rigorous chronological structure upon such a survey is difficult in that certain tendencies which were prevalent some seventy or eighty years ago have continued to appear intermittently up to the present day… At any rate, given the persistence of so many currents of research, it seems more appropriate to base this on a roughly thematic account of certain trends visible in recent scholarship than to attempt a ruthlessly chronological coverage.” Nesse sentido, buscamos, em certa medida, equilibrar as dimensões temáticas e cronológicas em nosso recorte, uma vez que a separação ou mesmo a prevalência de uma dessas duas concepções pode sugerir uma noção de progresso. Para outras relações, como, por exemplo, a de metacronologia, ver Swiggers (1990, p. 27).
5 Para uma contextualização geral sobre “os gramáticos latinos”, ver Fortes & Burghini (2021), disponível em: https://editoraunicamp.com.br/DynamicItems/Catalog/4f2758f8-bfea-4812-9ac2-4c715464f64920pp_W65.pdf.
6 Cf. “The term morphology has been used in Linguistics for well over a hundred years as a general description for the phenomena of accidence and word-formation. The term was borrowed from the biological sciences, and reflects, consciously or unconsciously, the view of language as an organism characterized by systems susceptible to synchronic and diachronic analysis” (Salmon, 2000, p. 15). Para um panorama ampliado sobre o tema, ver Salmon (2000, p. 15-22).
7 Cf. “Throughout the Middle Ages there is no terminology corresponding to ‘root’, ‘stem’, ‘affix’, ‘marker’, ‘morpheme’ and so forth.” (Law, 2000, p. 79-80).
8 Cf. “Morphology was a formal aspect of language which was pursued with greater confidence. Before the Renaissance the idea that one form could be derived from another was scarcely exploited. Each word was regarded as a semantic unit; there was no question of the isolation of smaller units...” (Law, 1990, p. 440).
9 Tradução de Dezotti (2011, p. 17). (cf. Plerique artem scribentes a litterarum tractatu inchoauerunt, plerique a definitione artis grammaticae. Sed omnes uidentur errasse. Non enim propriam rem officii sui tractauerunt, sed communem et cum oratoribus et cum philosophis. Nam de litteris tractare et orator potest; de voce nemo magis quam philosophis tractant; definition etiam Aristotelicorum est. Unde proprie Donatus et doctius, qui ab octo partibus inchoauit, quae specialiter ad grammaticos pertinente).
10 Para considerações textuais e contextuais, usamos a obra de Holtz (1981) sobre Donato e o ensinamento gramatical na Antiguidade Tardia. Para as citações do texto latino, usaremos a nomenclatura H = Holtz, mais número da página. No que se refere à tradução do texto de Donato, faremos utilização do trabalho de Dezotti (2011).
11 Para uma discussão sobre a estrutura das artes gramaticais latinas, ver Baratin (1994), em artigo traduzido e publicado pela Revista de Estudos Clássicos e Tradutórios Rónai (2017). Disponível em: https://doi.org/10.34019/2318-3446.2017.v5.23209.
12 A obra de Varrão conta com 25 livros, dos quais nem todos chegaram ao nosso tempo completos. Autores como Law (1990; 2003), Desbordes (2007) e Baratin (1989) dividem a obra do autor latino em três grandes temas. Recentemente Taylor (2020 [2015]) fez uma reanálise do corpus varroniano, sugerindo que a obra seja bipartida e não tripartida.
13 Taylor (1974); 2020 [2015]).
14 Para uma contextualização da obra de Donato, consultar Holtz (1981).
15 A obra também é mencionada pela tradição da gramaticografia greco-latina como De grammatica. Para uma discussão sobre os problemas filológicos do texto, ver Law (1984) e Bonnet (2013).
16 Todas as traduções de Donato são de Dezotti (2011, p. 158).
17 Tradução de Dezotti (2011, p. 158-9).
18 Donato, na Ars minor (H 600), já apresenta essa questão quando define o tópico das preposições: Praepositio quid est? Pars orationis, quae praeposita aliis partibus orationis significationem earum aut conplet aut mutat aut minuit. Praepositioni quot accidunt? Vnum. Quid? Casus tantum. Quot? Duo. Qui? Accusatiuus et ablatiuus. (“Preposição é o quê? É a parte da oração que, preposta às outras partes da oração, complementa, altera ou diminui a significação delas. A preposição tem quantos acidentes? Um. Qual? Somente caso. Quantos? Dois. Quais? Acusativo e ablativo” cf. Idem, p. 127). O aspecto sintético das definições também deixa clara a posição pedagógica do gramático, isto é, pode-se perceber o caráter didático do texto, já que as definições são curtas e em forma dialógica. Sobre a estrutura mnemônica e o aspecto dialógico das artes grammaticae, ver Law (1996, 2003) e Bonnet (2013).
19 Idem (p. 160).
20 Idem(p. 160).
21 Idem(2011, p. 129).
22 Para um estudo mais detalhado da estrutura da Ars Maior e Ars Minor de Donato, ver Holtz (1981, p. 49-74).
23 Conforme edição de Bonnet (2013), pela Les Belles Lettres.
24 Como podemos observar em Concêncio (GL V, 349, 22-4): simplex est quod ex una parte orationis constat, ut doctus potens; conpositum quod ex duabus, ut indoctus inpotens (“Simples é o que consta de uma parte da oração, como doctus, potens; composta é a que se forma de duas, como indoctus, inpotens”); Diomedes (GL I, 301, 24-6): figurae nominibus accidunt duae, simplex et conposita, simplex, ut doctus, conposita, ut indoctus (“De duas formas acidentam-se os nomes, simples e composta, simples, como doctus, composta, como indoctus”); e Carísio (GL I, 153, 21): figura [in] nominibus aut simplex est, ut felix, aut composita, ut infelix (“A forma [dos] nomes ou é simples, como felix, ou composta, como infelix”). Quanto à reflexão sobre a figura em outras partes da oração, é possível encontrar uma consideração no capítulo sobre particípio na Ars breuiata (I, 89), no qual Agostinho diz: accidunt participiis etiam figurae, sicut ceteris partibus orationis, simplex, ut scribens, conposita, ut describens (“As formas dos particípios também se acidentam, assim como as outras partes da oração, em simples, como scribens, e composta, como describens”).
25 Esses são os mesmos exempla presentes em Dositeu e Donato (H 624). Em Dositeu (IX, 17, ed. Bonnet, 2005), temos: “As formas dos nomes são duas: simples e composta. Simples, como felix [“feliz”]; composta, como infelix [“infeliz”]. Ademais, os nomes são compostos de quatro modos: a partir de dois completos, como suburbanum [“suburbano”]; a partir de dois incompletos, como opifex [“obreiro”]; a partir de um completo e um incompleto, como ineptus [“inapto”] e artifex [“artífice”]; ou a partir de um incompleto e um completo, como armipotens [“armipotente”]; às vezes, são compostos a partir de mais ainda, como inexpugnabilis [“inexpugnável”] e inexorabilis [“inexorável”]. (cf. Figurae nominum sunt duae: simplex et composita: simplex, <ut> felix; <composita, ut infelix>. Componuntur <autem> nomina modis IIII: ex duobus integris, ut suburbanum; ex duobus corruptis, ut opifex; ex integro et corrupto, ut ineptus, artifex; ex corrupto et integro, ut armipotens; aliquando ex pluribus, ut inexpugnabilis, inexorabilis). Tradução de Gonçalves (2018, p. 43).
26 Cf. “La morphologie est l’étude de la formation des mots.” É preciso considerar que a “morfologia”, dentro campo da gramática em meados do século XIX e XX no Brasil, estava situada, no mais das vezes, sob o estudo da lexicologia. A posição mais marcada dessa tradição pode ser encontrada em Said Ali, como comenta Cavaliere (2014). Em Ismael Lima Coutinho, em Pontos de Gramática Histórica (1971), assim como na Gramática do latim vulgar (1959), de Maurer Jr., é possível observar o mesmo processo.
27 Negrito e itálicos do original.
28 Segundo Swiggers (2000, p. 218): “Leonard Bloomfield (1926) [Postulates] defines the morpheme as a minimum form, whose meaning is a sememe; more precisely, the morpheme is defined by Bloomfield as a recurrent form which cannot in turn be analyzed into smaller forms”.
29 Silvio Elia (1976), no prefácio ao livro Princípios de linguística geral, de Câmara Jr. (1989 [1941]) pondera que: “o presente livro apresenta, portanto, a Linguística Geral na sua feição estruturalista. E o faz, assim como o desejava o seu Autor, com segurança de doutrina, equilíbrio científico e explanação didática. As recentes críticas ao Estruturalismo Linguístico na verdade resvalam por este livro. Em primeiro lugar, porque as setas e farpas dos transformacionalistas se dirigiram mais precisamente contra o Estruturalismo bloomfieldiano, de cunho mecanicista. Mattoso Câmara Jr. nunca foi um mecanicista, porque a isso se opunham as origens europeias de sua formação, basicamente humanista. Prova-o, p. ex., a sua maior inclinação para a teorização de Sapir do que para a de Bloomfield”. A consideração de Elia informa-nos sobre “a influência” teórica presente nas considerações de Câmara Jr. – no sentido que Koerner (2014) sugere aos historiógrafos da linguística. Esse aspecto erige também uma reflexão que, embora não possamos desenvolver no presente trabalho, aponta para a necessidade de se observarem as linhas teóricas presentes nas gramáticas de língua latina. É latente a influência que a escola francesa exerceu sobre o pensamento gramatical de Ernesto Faria, uma vez que estava em amplo diálogo com J. Marouzeau, questão que pode ser observada no prefácio da Fonética histórica do latim. Em Faria (1958), contamos também a referenciação bibliográfica para cada parte do estudo da língua latina, o que, em grande parte, direciona o nosso olhar para escola francesa, já que nomes como os de Ernout e Meillet também são amplamente citados. Em Cavaliere (2014), encontramos uma reflexão nessa direção para a gramaticografia brasileira.
30 Cf. Faria (1958, p. 55): “a atual enumeração das partes do discurso ascende a Dionísio Trácio, autor da mais antiga gramática grega. Assim, os romanos enfecharam os substantivos adjetivos na mesma denominação nomen. Não tendo, porém, artigos, suprimiram a denominação (árthron) e acrescentaram interiectio, com que designaram interjeição”. Essa definição sobre o campo da morfologia reaviva ou, em certo sentido, resgata a tradição gramatical grega alexandrina, uma vez que o tópico apresentado versa sobre as postulações de Dionísio Trácio, bem como elenca o caráter prototípico da reflexão gramatical latina, isto é, o aparecimento da análise e definição das “interjeições” e a supressão das considerações sobre o “artigo”. Recentemente Denecker e Swiggers (2018) reabriram a discussão sobre ἄρθρον ou articulus, com uma revisão historiográfica acerca do tópico.
31 Importante ressaltar que essa definição também já foi tema de longa discussão acerca da língua portuguesa; contemporaneamente, a questão parece estar pacificada, mas não estava em 1958, quando a obra foi escrita. Para mais detalhes sobre o tema da prefixação nas gramáticas de língua portuguesa, em especial depois da consolidação da NGB, ver Alves (2000) e Henriques (2009).
32 Note-se que a obra é posterior à NGB e este é mais um exemplo de como esse processo de interpretação sobre a prefixação não é homogêneo na história do pensamento gramatical e linguístico.
33 Para Ismael Lima Coutinho (1971, p. 166), as palavras são formadas por raiz, “também denominada de base e semantema”, e por afixos, que se dividem em: “prefixos e sufixos. Os primeiros aparecem antepostos à raiz; os segundos, pospostos.” Ainda segundo Coutinho (1971, p. 176), “consiste a prefixação em antepor-se à palavra um elemento secundário de formação, chamado de prefixo, que lhe soma ordinariamente uma ideia acessória. Se o prefixo se une a uma forma verbal, toma o nome de prevérbio. Em nota, o estudioso destaca que alguns autores, como por exemplo, Said Ali, Antenor Nascentes, Mattoso Câmara Jr. entre outros listados pelo autor, incluem a prefixação no processo de derivação (itálicos do original). Para uma reflexão sobre impacto das considerações de Antenor Nascentes na gramaticografia brasileira, ver Cavaliere (2014, p. 99-106).
34 Um fato intrigante emana, em certo sentido, do prefácio da obra de Maurer Jr., que diz: “Finalmente, algumas palavras de agradecimento. Em primeiro lugar, à douta Comissão Examinadora, composta dos ilustres Professores Dr. Francisco da Silveira Bueno, Dr. Mário de Sousa Lima, Dr. Ernesto de Faria, Dr. Serafim da Silva Neto e Dr. Américo de Moura, que julgou a nossa tese sobre latim vulgar, da qual o presente trabalho é uma parte reelaborada e ampliada.”. A menção a Ernesto Faria, assim como na referência bibliográfica, de seu texto de 1938, demonstra-nos o diálogo que havia entre estudiosos do latim clássico e do vulgar, mas que eles, em algum grau pela natureza do corpus e da abordagem, adota(ra)m uma terminologia distinta ao focalizarem um aspecto gramatical semelhante.
35 Ernout & Meillet (1951, p. 13) fazem referência a ad tanto como préverbe, ao formar novas palavras ao ser acrescentado a um verbo, como préposition, ao formar novas palavras ao ser acrescentado a um substantivo. Os autores falam ainda em composition, mas não há referência à prefixação.
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